Por: Odilon de Mattos Filho
“O Processo” é um famoso romance de Franz Kafka que conta a história do bancário Josef k. processado sem saber o motivo e depois assassinado pelos seus algozes. Essa obra é uma crítica ao sistema judiciário da antiga Tchecoslováquia.
“O Processo” é um famoso romance de Franz Kafka que conta a história do bancário Josef k. processado sem saber o motivo e depois assassinado pelos seus algozes. Essa obra é uma crítica ao sistema judiciário da antiga Tchecoslováquia.
No Brasil, historicamente, o sistema judiciário se apresenta como
despótico e ligado aos interesses da elite conservadora e preconceituosa.
Os tempos atuais corroboram de maneira, inequívoca, essa afirmativa. Dois
grandes processos que aconteceram nessas duas últimas décadas, “mensalão” e
“Operação Lava-jato” confirmam essa afirmativa e certamente, entrarão para
história do país por três razões: uma por desnudar as entranhas da corrupção no
Brasil, outra, com o ativismo político/judicial jamais visto na história do
judiciário e por fim, como a mais feroz e vingativa persecução penal contra
lideranças do campo progressista.
No “mensalão” a ministra da “Apequenada Corte”, Rosa Weber disse: “Não
tenho provas contra José Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura assim
me permite1”. Este trecho do voto da ministra
Weber é emblemático para demonstrar como o julgamento se deu de forma parcial,
aliás, por “coincidência” quem escreveu este voto foi o seu assistente à época,
nada mais, nada menos, que o juiz Sérgio Moro. A primeira semelhança com o
romance de Franz Kafta!
Já com relação à Operação Lava-jato observamos importantes
desdobramentos para o país, mas, por outro lado, essa Operação despertou em
grande parte da sociedade sentimentos nunca vistos no Brasil, como o espírito
vingativo, a intolerância, o ódio e o preconceito, aliás, estes sentimentos
contaminaram, também, quase toda classe política, judiciária, empresarial e
midiática e é sobre esse lado perverso da operação que vamos comentar,
especificamente, sobre algumas ilegalidades e arbitrariedades no processo que
envolve o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A primeira ilegalidade cometida pelos agentes estatais foi logo na
fase das investigações. Lula, sem nunca ter sido intimado ou notificado,
foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento à PF. Um flagrante
atentado à Constituição Federal (artigo 5º) e ao Código de Processo Penal
(artigo 260).
Depois deste episódio vieram as escutas e a divulgação para imprensa das
conversas telefônicas particulares entre Lula e seus familiares, após, o mais
grave: a divulgação para imprensa da escuta da presidenta Dilma em pleno
exercício com o ex-presidente Lula. Aqui ilegalidades e inconstitucionalidades
cometidas pelo Juiz Sérgio Moro não faltaram, mas, mesmo diante dessas
arbitrariedades as cortes superiores se apequenaram, acovardaram e silenciaram amedrontadas
com uma possível reação da opinião publicada. .
Em decorrência deste vazamento o ministro tucano Gilmar Mendes concedeu
de maneira ilegal e inconstitucional liminar impedindo que Lula fosse nomeado
Ministro de Estado, enquanto, pouco tempo depois, Moreira Franco e mais um bando
de políticos, comprovadamente corruptos, assumiram cargos de ministros. Dois
pesos, duas medidas!
Já na fase processual as anomalias, ilegalidades e arbitrariedades
recrudesceram. O primeiro fato que nos chama atenção é com relação aos sistemas Drousys e MyWebDay
utilizados pela Odebrecht. Sabe-se que estes sistemas foram à base para as
denúncias contra Lula. E é aqui que começa o jogo armado pelo sistema judicial.
Considerando
esses sistemas como fator principal das denúncias, a defesa de Lula requereu
acesso a esses dados, mas, o juiz Sergio Moro negou alegando que “a Suíça não
tinha compartilhado os dados e Hilberto Mascarenhas, o diretor do DOE, que
supostamente teria as chaves da criptografia do sistema, havia afirmado ter se
desfeito delas2”. Uma grande balela que,
claramente, caracteriza o desprezo pelo princípio da paridade de armas e o
cerceamento de defesa, além do que, é um o argumento, nitidamente
contraditório, pois, como os supostos dados originais vazaram para a imprensa e
constaram das delações?
Não
satisfeitos os advogados de Lula recorreram ao TRF-4 para ter acesso aos
sistemas, mas, novamente, foi indeferido pelos “judiciosos” e “abnegados”
desembargadores.
Fica
evidente que os pedidos dos advogados de Lula incomodavam o Juiz Sérgio Moro,
os procuradores e os desembargadores, e isso por um simples e óbvio motivo: não
há prova alguma contra Lula nos sistemas e o acesso poderia, ainda, comprovar
que os extratos do Meinl Bank são, realmente, falsos e demonstrar,
também, que outros figurões da política e do próprio sistema judiciário
participavam de esquemas montados pela empresa Odebrecht.
Esse
episódio sobre os dados MyWebDay efetivamente é muito contraditório e o fato do
MPF sentar encima desses dados torna o caso altamente suspeito. A PF, por
exemplo, reclamou que o MPF não disponibilizou o acesso aos dois sistemas da
Odebrecht. Em despacho o Delgado da PF Alex Bersan assim se manifestou:
“Registro que desde a chegada destes autos no âmbito da Polícia Federal, em 02
de julho de 2017, transcorreram pouco mais de 05 (cinco) meses sem que os
sistemas de comunicação e contabilidade paralela da Odebrecht tivessem sido
disponibilizados pelo MPF à PF para realização da perícia técnica, com as
cautelas necessárias, e posterior acesso aos dados para comprovação ou não do
teor dos relatos dos colaboradores3”.
Neste
caso dos sistemas Drousys e MyWebDay tem um
personagem que pode desmascarar todo esse complô, estamos falando do advogado
Tecla Duran que prestava serviço à Odebrecht e é um profundo
conhecedor destes sistemas.
Segundo
consta no livro que será lançado por Duran
e que alguns jornalistas tiveram acesso, a primeira denúncia que ela faz é
bombástica e extremamente grave. Para começar Duran afirma que os
extratos do Meinl Bank foram falsificados e seis evidências
comprovam essa afirmativa, dentre elas citamos: extrato da Innovation com somas
erradas; extratos originais do banco apresentam números negativos com sinal, ao
contrário do extrato montado, em que eles aparecem em vermelho; formatação das
datas de lançamento totalmente diferente de outros documentos do banco, que
seguem o padrão americano: Mês/Dia/Ano, dentre outras evidências demonstradas
em um precioso artigo postado no site GNN pelo jornalista Luís Nassif.
Vale
lembrar que as delações de executivos da Odebrecht foram respaldadas por uma
única prova, exatamente, os “falsos” extratos capturados dos sistemas Drousys e
MyWebDay.
Outra
denuncia de Tecla Duram é que ele foi chantageado para aceitar a delação
premiada e endossar versões que não correspondiam à verdade. O Advogado Carlos
Zucolotto Júnior, coincidentemente, amigo e pardinho do juiz Sérgio Moro,
propôs a Tecla Duran uma redução da multa de US$ 15 milhões para US$ 5 milhões
caso aceitasse fazer a delação nos termos propostos. No dia seguinte dessa
proposta, Tecla Duran recebeu e-mail dos procuradores propondo um acordo de
delação nos mesmos moldes sugerido por Zucollotto.
Segundo
artigo de Luís Nassif “para disfarçar a redução da pena pecuniária, os
procuradores recorriam a uma esperteza. A pena ficava em US$ 15 milhões a serem
confiscados de determinada conta corrente – que a Lava Jato sabia, de antemão,
estar vazia. Nada encontrando, seria substituída por outro confisco, de US$ 5
milhões, a sair de uma segunda conta de Tacla Duran, esta sim, com fundos4”.
Outro
fato envolvendo Tacla Duran chama atenção. ”No 04/12/2017 deveria ocorrer
audiência em Madri entre os procuradores de Curitiba e Rodrigo Tacla Duran,
para apurar as denuncias contra o amigo de Moro por ter proposto ajuda em
delação, mediante pagamento por fora... A audiência acabou não se realizando e
a força tarefa não quis explicar as razões...Nenhum dos membros da força-tarefa
compareceu ao compromisso solicitado às autoridades espanholas pela própria
Lava Jato5”. Diante disso, perguntamos: Por que o
MPF e o juiz Sérgio Moro não ouviram Tecla Duran?
Não
restam dúvidas de que estes fatos sobre os dois sistemas, Drousys e MyWebDay da
empresa Odebrecht e a recusa em ouvir o advogado Tecla Duran são as chaves para
se desmontar toda essa patranha montada pelo sistema judiciário.
Outra
aberração, arranjo ou artimanha processual que chamou a atenção de todos os brasileiros
foi com relação à propriedade do tríplex. Está comprovado que o apartamento
está registrado em nome da empresa OAS, aliás, poucos dias antes do julgamento
do recurso, uma juíza federal mandou penhorar este imóvel para garantir o
pagamento de uma dívida da OAS com o seu credor. Não precisa ser advogado
para saber que quem detém a propriedade de um imóvel é aquele(a) que o tem,
devidamente, registrado no Cartório de Registro de Imóvel (CRI). Pois bem, os
procuradores e o juiz Sérgio Moro tiveram a desfaçatez de “alterar” o “Capítulo II - Da Aquisição da Propriedade Imóvel” do
Código Civil Brasileiro para incriminar o presidente Lula, para tanto,
acrescentaram a aquisição da propriedade por “convicção”, ou seja, se o
magistrado não possui provas, como escritura, registro no CRI, posse direta e
indireta de que o cidadão é propriedade do imóvel ele pode decidir, por
“convicção” de que o imóvel objeto da demanda pertence ao autor ou ao réu da
ação possessória. Isso é gritantemente absurdo e revoltante!
E para
fechar a análise dessas flagrantes ilegalidades, lembrando que existem inúmeras
outras vale citar a “confissão” de ilegalidade cometida pelo do juiz
Sérgio Moro quando da resposta nos Embargos de Declaração proposto pelos
advogados de Lula. Diz o juiz de piso: ”Este juízo jamais afirmou, na sentença
ou em lugar algum, que os valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos
com a Petrobras foram usados para pagamento de vantagem indevida para o
ex-presidente6". O que significa
isso? Significa que o juiz Moro admite que o processo jamais devesse ter
tramitado na Vara de Curitiba, pois, não tem qualquer relação com a Petrobras
segundo a narrativa apresentada pelos procuradores. Trocando em miúdos, não foi
obedecido o princípio do juiz natural.
Mesmo diante de todos esses ecandalosos casos que poderiam colocar em cheque ou até mesmo anular o processo, o TRF-4, que faz parte do golpe, manteve a sentença de Sérgio Moro.
Aliás, o voto do Desembargador/Relator, Gebran Neto nessa sórdida persecução penal ao presidente Lula já era conhecido a tempo. Numa palestra proferida em Buenos Aires, bem antes dos autos chegarem ao TRF-4 e já tentando justificar uma condenação sem prova, o “judicioso” desembargador utilizou-se de malabarismos e subterfúgios jurídicos para sustentar a sua tese. Disse o magistrado: ”...acabou a ingenuidade” nos julgamentos de casos de corrupção, nos quais não se deve esperar mais uma “prova insofismável” para eventualmente condenar um acusado, sendo bastante uma “prova acima de dúvida razoável”, desde que seja possível identificar uma “convergência” nos elementos probatórios de determinado processo. Um conjunto de indícios e provas bastaria em alguns casos para condenar7".
E para fecharmos este texto, não podemos, ou melhor, não devemos deixar de lembrar a barbárie contra o Reitor da UFSC, Professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, que assim como Lula foi conduzido coercitivamente e preso de maneira ilegal e arbitrária e que em decorrência destes claros excessos cometidos por agentes do Estado de Exceção o levou ao suicídio. E hoje, passados cento e vinte dias desta tragédia, nada se provou contra o professor Cancellier. Com relação às investigações sobre as responsabilidades pelos excessos cometidos pelos agentes estatais, tudo indica que o inquérito será, sumariamente, arquivado, assim como ocorria na ditadura militar, “cujas narrativas imputavam às vítimas a responsabilidade pelas mortes anunciadas nos processos do regime8”.
Mesmo diante de todos esses ecandalosos casos que poderiam colocar em cheque ou até mesmo anular o processo, o TRF-4, que faz parte do golpe, manteve a sentença de Sérgio Moro.
Aliás, o voto do Desembargador/Relator, Gebran Neto nessa sórdida persecução penal ao presidente Lula já era conhecido a tempo. Numa palestra proferida em Buenos Aires, bem antes dos autos chegarem ao TRF-4 e já tentando justificar uma condenação sem prova, o “judicioso” desembargador utilizou-se de malabarismos e subterfúgios jurídicos para sustentar a sua tese. Disse o magistrado: ”...acabou a ingenuidade” nos julgamentos de casos de corrupção, nos quais não se deve esperar mais uma “prova insofismável” para eventualmente condenar um acusado, sendo bastante uma “prova acima de dúvida razoável”, desde que seja possível identificar uma “convergência” nos elementos probatórios de determinado processo. Um conjunto de indícios e provas bastaria em alguns casos para condenar7".
E para fecharmos este texto, não podemos, ou melhor, não devemos deixar de lembrar a barbárie contra o Reitor da UFSC, Professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, que assim como Lula foi conduzido coercitivamente e preso de maneira ilegal e arbitrária e que em decorrência destes claros excessos cometidos por agentes do Estado de Exceção o levou ao suicídio. E hoje, passados cento e vinte dias desta tragédia, nada se provou contra o professor Cancellier. Com relação às investigações sobre as responsabilidades pelos excessos cometidos pelos agentes estatais, tudo indica que o inquérito será, sumariamente, arquivado, assim como ocorria na ditadura militar, “cujas narrativas imputavam às vítimas a responsabilidade pelas mortes anunciadas nos processos do regime8”.
Este lamentável e terrível episódio ilustra de maneira peremptória
os caminhos kafkianos que a Operação Lava-jato e outras operações
traçaram para conduzir a ânsia punitiva e desmedida dos agentes do Estado
contra cidadãos brasileiros.
De tudo
isso não paira dúvida de que vivemos um Estado de Exceção no qual o sistema
judiciário é peça chave para que se cumpram os objetivos do golpe iniciado em 2006, tanto, que os
resultados desses processos judiciais não passam de meras formalidades
arquitetadas por essa elite conservadora e preconceituosa. Aliás, o Juiz Robert
Jackson, da Corte Suprema dos EUA em certa ocasião disse: “...há certos
julgamentos que não passam de uma cerimônia legal para averbar um
veredito já ditado pela imprensa e pela opinião pública que ela gerou9”. Viva o Brasil..!
1 Fonte:
http://www.jb.com.br/leonardo-boff/noticias/2013/12/03/uma-justica-sem-venda-sem-balanca-e-so-com-a-espada/
2 Fonte:
https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-da-grande-manipulacao-da-lava-jato-por-luis-nassif
3 Fonte:
https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-da-grande-manipulacao-da-lava-jato-por-luis-nassif
4 Fonte:
https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-da-grande-manipulacao-da-lava-jato-por-luis-nassif
5 Fonte:
https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-da-grande-manipulacao-da-lava-jato-por-luis-nassif
6 Fonte:
http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/01/triplex-no-guaruja-que-lula-nega-ser-dele-rendeu-condenacao-prisao.htm
7Fonte: https://www.conversaafiada.com.br/brasil/amigao-do-moro-vai-condenar-lula-por-convergencias
7Fonte: https://www.conversaafiada.com.br/brasil/amigao-do-moro-vai-condenar-lula-por-convergencias
8 Fonte:
https://www.conversaafiada.com.br/brasil/ministro-da-justica-sic-quer-arquivar-investigacao-sobre-o-suicidio-do-reitor-cancellier
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