segunda-feira, 27 de novembro de 2017

O SISTEMA JUDICIAL RETROCEDEU A “IDADE DAS TREVAS”

Por:  Odilon de Mattos Filho

A cultura penal da Idade Média sempre esteve ligada às características punitivas nas quais o cidadão era submetido a castigos corporais e à pena de morte e tudo realizado publicamente proporcionando “espetáculos” à população. Tendo em vista essas crueldades esse período ficou conhecido como “dark ages” ou Idade das Trevas.

Nesse período o “sentimento de justiça sólida como um muro e duro como uma pedra, era próprio do homem medieval. O sentimento de justiça consistia em uma sede de vingança. Ninguém duvidava um instante que um criminoso merecia sua pena...Todos ficavam profundamente satisfeitos quando o próprio príncipe ditava uma sentença. O que mais impressiona na crueldade judiciária do fim da Idade Média é a perversidade doentia e a alegria animalesca e embrutecida do povo e a atmosfera de quermesse1”.

Mas malgrado todo esse sistema punitivo, foi neste período que apareceram as primeiras leis escritas da Idade Média, conhecidas por “Capitulares”. “Embora Carlos Magno se reservasse a decisão final, debatia-se com os nobres as questões e depois ordenava as normas. As leis eram decretadas na medida das necessidades e não se buscando prever casos futuros2”.

Se traçarmos um paralelo sobre a aplicação do Direito na Idade Média e nos dias de hoje, podemos constatar que não é nenhum exagero afirmar que retrocedemos à Idade Medieval. O “modus operandi” da Operação Lava-jato corrobora tal afirmativa. Se observarmos com maior acuidade as manobras da chamada Força Tarefa é fácil constatar algumas características da Idade Média, a começar pelo juiz Sérgio Moro que assim como Carlos Magno reserva para si toda decisão dos crimes investigados pela Operação lava-jato, com ou sem conexão e cometidos em qualquer Estado da Federação, ou seja, o princípio do Juiz Natural previsto na Constituição Federal foi jogado as favas, inclusive, com a cumplicidade de instâncias superiores.

O Poder que Sérgio Moro conferiu a si é tamanho e tão semelhante aos antigos Reis da Europa Medieval que em entrevista à revista "Veja" ele afirma que não se arrempende de ter divulgado o grampo telefônico entre a então presidenta Dilma e o ex-presidente Lula, ou seja, o justiceiro rasgou a Constituição Federal, ficou acima das leis e ainda se vangloria de tal proeza. É ou não é absoluto como os Reis da Idade Média? 

Outro fato de absolutismo são as prisões cautelares que muito se assemelham a Idade Média, malgrado a legislação penal impedir abusos, como por exemplo, prisões preventivas e provisórias Ad aeternum. Mas mesmo sendo ilegais, são amplamente utilizadas a critério do juiz Moro com o claro objetivo de “em tese”, torturar psicologicamente o investigado e/ou acusado para realizar delação premida, mesmo que falsa, mas que comprometa o alvo principal dessa operação, chamado Luiz Inácio Lula da Silva.

Hoje no Brasil se prende para depois investigar! O princípio constitucional da presunção de inocência, também, foi jogado as favas pelo Rei Sérgio Moro. Para a Força Tarefa os Direitos e garantias individuais são letras mortas da Constituição Federal e os exemplos são vastos e já citados em vários textos deste modesto escriba, assim como, em fundamentados artigos de brilhantes juristas pátrios e de outros países.

Já é rotina, também, especialmente, na Operação Lava-jato a exposição pública do investigado e/ou do acusado. Na Idade Média os presos eram carregados em carroças pelas ruas e suas penas de morte ou açoite eram públicas, hoje essa exposição pública é feita nos telejornais para delírio e deleite dos populares que foram manobrados por essa mesma mídia e pelo Sistema Judiciário que moldaram o inconsciente coletivo ao seu pensamento único. 

É paradoxal, mas o que mais choca nessa barbárie é saber que essa prática é cometida pelo próprio Estado, por um lado, pelo fiscal da lei que é o Ministério Público e por outro, pelas emissoras de rádio e televisão que são concessões públicas.

Aliás, nesse sentido o ex-procurador do MPF Eugênio José Guilherme de Aragão, com a costumeira precisão escreveu: “...Nunca, depois do iluminismo, se festejou tanto, nestas terras, o suplício exposto de alvejados pelo sistema persecutório, quanto nos dias atuais, em tempos de Lava-Jato. Falta só amarrá-los na roda e esquartejá-los em praça pública. E a massa celerada ovaciona o ministério público que lhe proporciona tamanho show..3”

O mais recente exemplo dessa promiscuidade, incivilidade e fragrante atentado à Constituição Federal foi o fato do Ministério Público ceder à Rede Globo de Televisão imagens de uma “inspeção” que foi realizada no presídio de Benfica, no Rio de Janeiro e às celas de Sérgio Cabral, Anthony Garotinho, Jorge Picciani, Rosinha Matheus e de Adriana Ancelmo, com a execração pública dos citados presos, que diga-se de passagem, sem culpa formada. Essa filmagem foi mostrada, no dia 26/11/2017, em rede nacional no programa “Fantástico”, aliás, não é de hoje que o Sistema Judicial tem uma relação de compadrio e promiscuidade com a “mídia nativa”, especialmente, na defesa de seus interesses comuns.

A propósito, pedimos vênia para transcrever parte do voto da ministra Carmem Lúcia no Habeas Corpus nº 91.952/SP que retrata com brilhantismo esse momento de trevas que o Sistema Judicial brasileiro vem passando. Diz a ministra: “..Vivemos, nos tempos atuais, o Estado-espetáculo. Porque muito velozes e passáveis, as imagens têm de ser fortes. A prisão tornou-se, nesta nossa sociedade doente, de mídias e formas sem conteúdo, um ato de grande teatro que se põe como se fosse bastante a apresentação de criminosos e não a apuração e a punição dos crimes na forma da lei.(…) O ser humano não é troféu para ser apresentado por outro, inclusive com alguns adereços que podem projetar ainda mais uma situação vexaminosa e de difamação social..4"

Ademais, com relação a essa matéria do "Fantástico, vale lembrar que o artigo 5º, inciso X, da Carta Cidadã determina que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, previsão essa estendida, também, aos presos, pois o inciso XLIX da CF/88 assegura-lhes o respeito à integridade física e moral e o artigo 41, inciso VIII, da Lei 7.210/84, garante ao preso “proteção contra qualquer forma de sensacionalismo”, ou seja, mais uma vez o poder absoluto instalado no Brasil pisoteou a Constituição Federal e descumpriu a lei sem nenhuma parcimônia. 

Por fim, vale esclarecer que este texto não tem o condão de defender criminosos, ao contrário, queremos que todos sejam julgados dentro do processo legal e se culpados punidos nos termos da lei. O que não devemos é nos calar diante de abusos, mesmo porque, amanhã quem poderá sofrê-los somos nós, essa é a razão concreta!

Assim, e frente a mais este fragrante atentado à Constituição Federal cometida pelo Ministério Público, aguardamos a reação dos doutos magistrados encarregados pela Execução Penal destes réus e a pronta manifestação das Cortes Superiores e do Conselho Nacional do Ministério Público, caso contrário, não será nenhum disparte afirmamos que o Sistema Judicial brasileiro retrocedeu a Idade Média!




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