terça-feira, 6 de maio de 2014

#SomosTodosDeÁfrica


“Não ligo que me olhem da cabeça aos pés..porque nunca farão minha cabeça e nunca chegarão aos meus pés” – Bob Marley


Malgrado alguns senões, podemos afirmar que o Brasil é um exemplo em matéria de legislação no combate ao racismo. Temos leis infraconstitucionais, como, por exemplo, o “Estatuto da Igualdade Racial” e a própria Lei Maior do País que prevê que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei” (art. 5º, XLII).

Mas, mesmo diante desse arcabouço legal, parece que as leis não são suficientes para constranger as inúmeras atitudes e atos de racismo no Brasil e mundo afora. Dessa forma, não obstante a importância das mesmas nos afigura que o fim dessa barbárie somente ocorrerá a partir da educação e do momento que se tratar a luta contra o racismo sem desvios, hipocrisias ou mentiras. 

A falsidade no debate sobre o preconceito racial, lamentavelmente, toma conta de quase todos os segmentos da sociedade, e por mais paradoxal que seja até mesmo na grande mídia. O jornalista global, Ali Kamel, por exemplo, teve o desplante de lançar um livro cujo título é: “Não somos racistas”. Nessa “obra” ele sustenta que não há discriminação racial no Brasil e que todos vivem em total harmonia. Está claro de que se trata de um antagonismo que em nada contribui para o bom debate, ao contrário, distorce e tenta encobrir os rotineiros casos de racismo no Brasil, que saltam aos olhos.

O racismo, como sabemos, não é uma prática, meramente “tupiniquim”, o mundo está cercado por todo tipo de intolerância, em especial a racial. No dia 27 de abril, por exemplo, o planeta foi surpreendido com mais um terrível caso de racismo. Desta feita foi na Espanha, e a vítima foi o brasileiro Daniel Alves, jogador do Barcelona.  O caso ocorreu durante a Partida contra o Villarreal. Quando Daniel Alves se preparava para cobrar um escanteio um torcedor jogou uma banana fazendo alusão ao macaco. Em ato contínuo e com uma pronta e inteligente reação, Daniel Alves pegou a fruta e a comeu. Essa imagem ganhou o mundo e obteve reações duras e firmes contra o racismo, mas, também, houve ações oportunistas e hipócritas.

Logo em seguida ao episódio, o Atleta Neymar, em “solidariedade” ao colega, Daniel Alves lançou, nas redes sociais, uma campanha denominada #somostodosmacacos. Essa campanha ganhou apoio de inúmeras personalidades, dentre elas, Luciano Huck. No entanto, descobriu-se depois que tal campanha foi idealizada pela agência de publicidade “Loducca”, e o mais terrível: Luciano Huck pegando carona na campanha, colocou à venda camisetas com o slogan #somostodosmacacos, ou seja, para Neymar foi uma jogada de marketing, e para o apresentador global, a luta contra o racismo se transformou em fonte de renda.

Aliás, essa campanha mereceu inúmeras críticas, a contar do próprio Daniel Alves, que disse: “...."Eu não gosto muito do #somostodosmacacos, porque acho que a gente é a evolução disso. Somos humanos e todos iguais. Acho que é isso que devemos defender...Marcas me procuraram, mas eu não quero ganhar com isso, não quero popularidade. Não quero ganhar nada a não ser a luta contra o racismo..."

Nessa mesma linha a Ministra a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros, manifestou: "...Essa imagem do macaco associada à pessoa negra é uma imagem muito poderosa. E se você assume essa imagem como válida, corre o risco também de reforçar o estereótipo. Eu entendo a campanha e a motivação da campanha, mas não é possível assegurar que ela tenha o sucesso necessário para reverter a representação negativa que a palavra 'macaco' tem quando associada à pessoa negra...."

Por sua vez, o Professor e militante do Movimento Negro, Douglas Belchior, assim se posicionou:“...a atitude de Daniel Alves não há o que interpretar. Ele elaborou uma reação objetiva ao racismo: Vamos ignorar e rir!....Neste país, assim como em todo o mundo, a comparação de uma pessoa negra a um macaco é algo culturalmente ofensivo....Eu como negro, não admito. Banana não é arma e tampouco serve como símbolo de luta contra o racismo. Ao contrário, o reafirma na medida em que relaciona o alvo a um macaco e principalmente na medida em que simplifica, desqualifica e pior, humoriza o debate sobre racismo no Brasil e no mundo...Eu adoro banana. Aqui em casa nunca falta. E acho os macacos bichos incríveis, inteligentes e fortes...Viemos deles e a história da evolução da espécie é linda. Mas se é para associar a origens, por que não dizer que #SomosTodosNegros  ou #SomosTodosDeÁfrica ? Porque não lembrar que é de África que viemos, todos e de todas as cores? E que por isso o racismo, em todas as suas formas, é uma estupidez incompatível com a própria evolução humana? E, se somos, por que nos tratamos assim?"

Diante de tudo isso cabe a nós rechaçar qualquer forma de preconceito, em especial o racial, bem como confrontar e denunciar, publicamente, todos aqueles oportunistas que deturpam o debate ou que fazem da luta contra o racismo trampolim para seus interesses pessoais. Essa luta é muito mais ampla, ela é coletiva e o debate deve ser aberto, radical, sem subterfúgios e pautado nos conhecimentos sociológicos e políticos de todo o processo histórico que envolve o embate contra o racismo. Diferente disso é puro oba,oba...! 

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